Vejo com tristeza que muitos dos brasileiros e brasileiras são hipócritas. Qualquer pessoa de bom coração dirá que não concorda com a violência contra a mulher, no entanto, a tão debatida pesquisa feita pelo IPEA mostra que:
- 65% dos entrevistados disseram concordar com a frase: "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas"Ou seja, para esta maioria a mulher passa de vítima à ré dependendo do tamanho da saia ou do decote.
- 58,5% dos entrevistaram responderam que concordam com a frase: "se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros"
Se a mente perversa e pervertida do estuprador não consegue lidar com a presença de mini saias, se descontrola ao vislumbrar uma coxa feminina ou mesmo seios à mostra, o lugar deste indivíduo é na cadeia, não a rua.
O Ipea revelou que todos os anos no Brasil acontecem ao menos 527 mil casos de estupro, mas apenas 10% são registrados na polícia. E em 70% dos casos notificados, as vítimas são crianças e adolescentes e os agressores, na sua maioria, são ou pais/padrastos (24,1%) ou conhecidos (32,2%) das vítimas.
Doentes devem pensar que estas crianças e adolescentes também "pediram"para serem agredidas.
Outra pesquisa mostrou que em 2012 o total de estupros no Brasil ultrapassou os registros de homicídios (a pesquisa é a mais recente). Naquele ano foram registrados 50.617 casos de violência sexual (só os registrados, lembrando que muitas mulheres não denunciam por medo ou vergonha). No mesmo período, houve 50.108 assassinatos - homicídios dolosos e latrocínios.
Estima-se que a cada 12 minutos 1 mulher é estuprada no país.
A cada 12 minutos: e poderia ser eu ou você.
Segundo esta pesquisa Santa Catarina é o terceiro (!!!) Estado no ranking do com maiores índices de estupro do país, com uma taxa de 45,8 casos para cada 100 mil habitantes, enquanto os casos de homicídio em 2012 foram de 11,3 por 100 mil habitantes.
Em Santa Catarina, segundo o relatório, em 2012 foram cometidos 2.925 estupros. O maior número aconteceu na Grande Florianópolis: foram 118 casos e a maioria deles, 94 casos, cometidos contra crianças ou adolescentes.
Nestas horas não tenho orgulho de ser brasileira: tenho vergonha.
E aqui na "Ilha da Magia", as "moças faceiras" não podem andar pelo calçadão do centro da cidade de vestido, decote, short ou qualquer roupa que, na percepção de certos homens tacanhos (e alguns verdadeiros monstros), qualquer roupa que mostre mais que uma burca é uma espécie de convite, tornando o corpo da mulher algo público e passível de ser molestado.
Em Florianópolis se você é mulher e "ousa" usar saias ou shorts para circular pelas ruas do centro significa, em qualquer idade, ser incomodada com palavras de conotação sexual, desrespeito ao seu direito de ir e vir sem ser abordada por estranhos, incluindo possíveis "passadas de mão".
Nas baladas homens literalmente seguram as mulheres pelos cabelos... e os cheiram. Como se fossem bichos procurando uma fêmea.
Você, que é uma moça educada e dona do seu nariz provavelmente não vai gostar nada de ver seu cabelo limpinho e escovado sendo segurado por um estranho.
Você, como eu, provavelmente quer ir ao centro da cidade sem pensar: "melhor não colocar esta roupa, pois podem querer passar a mão".
Quer pegar um ônibus sem medo de ser "encoxada".
E se um dia for assediada, vai esperar que as pessoas julguem o filho da p*** que fez algo que você não consentiu, sem lhe perguntarem como você estava vestida.
Em caso de estupro ou qualquer tipo de violência ou abuso sexual, não importa como você estava vestida.
Uma prostituta pode ser estuprada? Sim, pode. Basta ela ter dito não. Ela pode não querer fazer aquele programa.
A esposa pode ser estuprada por seu marido? Sim, pode. Basta ela ter dito não. Ela tem o direito de não estar com vontade.
Uma mulher nua num motel pode ser estuprada? Sim, pode. Basta ela ter dito não. Ela pode ter mudado de ideia, ter se arrependido de estar lá com aquela pessoa, ter perdido o desejo.
Se uma das partes não consentiu o ato sexual (ou porque disse "não", ou porque não tem idade suficiente para tomar esta decisão ou porque estava inconsciente) - é crime.
Estupradores e abusadores tem um desvio de personalidade, são sociopatas, mas na maioria das vezes sabem exatamente o que estão fazendo, não são "loucos": e fazem pois pensam em suas vítimas como objetos e não pessoas, dando desculpas esfarrapadas para explicar seu comportamento abjeto: "ela pediu", "mas estava quase nua", "vi ela olhando para mim", "homem não consegue se segurar", "ela gostou".
E assim seguem a vida molestando mulheres (e também meninos), adolescentes e crianças, como se estes fossem os culpados dos seus pecados que de tão graves, não deveriam ter perdão.
Não faça parte destes 65% da pesquisa: julgue o criminoso capaz de agressão tão odiosa, não a vítima que provavelmente teve sua pior experiência na vida.
Eduque os homens: você que é mãe ou pretende ser, não compactue com este pensamento distorcido que a culpa é da vítima, que seu filho tem que "ser machão e pegar todas".
Se você diz não, é não. Seu padrasto, tio ou professor não tem direito a tocar em você. Se namorado ou ficante não tem direito de se aproveitar porque você bebeu demais. Não se sinta culpada pela mente doentia destes homens e não permita que estes covardes monstros digam que você "merece".
Shirley,
ResponderExcluirUm texto tocante e urgente. Esta é a realidade onde muitas mulheres são caladas à força de agressão e ameaças, inclusive aos filhos. Quem é vítima não tem mais vida.
Uma triste e repugnante consequência da sociedade machista e patriarcal em que vivemos.
Pessoas que não se colocam no lugar de um ser humano. Protecionismo do agressor, a atitude mais covarde de expôr a vítima para tirar o foco da agressão cometida.
"O mundo só será mundo quando as pessoas forem gente."